Na terra dos mouros - guia prático de sobrevivência em 7 passos
Como tripeira que emigrou para a capital (ficaram a pensar que emigrar aqui está mal aplicado, confessem... Mas não está e eu explico: o Porto é uma nação, logo se se sai da nação, emigra-se :P) acho que deveria partilhar convosco algumas dicas de como sobreviver na terra dos mouros (ah se eu soubesse o que sei hoje tinha evitado tantas figurinhas tristes...):
1 - Faça-se difícil. Numa primeira abordagem, não diga mais de 3 ou 4 palavras seguidas para não desatarem a fugir a 7 pés. É que esta gente desconfia de uma pessoa muito simpática logo à partida, ficam logo a achar que lhes estamos a tentar impingir alguma coisa ou que os vamos degolar aí numa mata qualquer. Os alfacinhas são gente muito simpática mas que para se dar a conhecer requer algum namoro. É preciso flirtar com eles, estão a ver a coisa? Não partam logo pra violência que os assustam:P;
2 - Ainda na onda do ponto anterior, nunca olhe os seus vizinhos nos olhos por mais que 2 cagagésimos de segundo pois correm o risco de terem a P.J. à perna por assédio, perseguição ou tentativa de extorsão caso tenha a infeliz ideia de ir bater à porta a pedir uma cebola ou um pouco de sal. Se se cruzarem com alguém nas escadas do prédio, arranjem maneira de impedir o contacto visual nem que para isso tenha de saltar pela janela ou para o poço do elevador. Talvez ao fim de uns 20 anos possa dizer um olá (tímido) e de 40 pedir um raminho de salsa;
3 - Conduza sempre com a mão na gaita (cá diz-se buzina)! Por cá apita-se por tudo e por nada. O sinal muda para verde, apita-se. O sinal passa a vermelho apita-se. Pessoa muda de faixa de rodagem, apita-se. Pessoa entra na rotunda, apita-se. Pessoa sai da rotunda, apita-se. Por isso se quiser conduzir sem dar nas vistas aqui na capital tenho dois conselhos: prepare-se para as travadelas a fundo na faixa da esquerda da segunda circular e agarre-se à gaita. Não há que enganar;
4 - Se for almoçar ou jantar fora faça um favor a si mesmo e leve uma buchazinha. É que aqui paga-se muito por uma dose mínima, tão pequena que mal dá para a covinha de um dente. A malta vem habituada às doses que dão para alimentar meio continente Africano e depois resente-se. Vá por mim, convidam-no para um jantar, vá aviado de casa com um farnel;
5 - Traga sempre consigo um caderninho para apontar as palavras novas que for aprendendo: eles é ténis para calçado, refogado para estrugido, bica para café (deixem lá o cimbalino em paz que isso já não se usa desde o tempo da Maria Cachucha), cabide para cruzeta... Se, como eu for profissional de saúde, tenha em mente que por alguma razão estranha uma ampola aqui é uma fórmula (esta ainda hoje estou para perceber de onde veio) e uma pesquisa de glicémia capilar é um BM test. Acho que já percebeu que esse caderninho será o seu melhor amigo para se entrosar e lhe poupar meia hora de converseta sempre que pedir um fino ao balcão, que isto de ser simpático por se ser do norte é uma coisa mas levar com os saudosismos de meia Lisboa é outra completamente diferente: "Ahhh já fui tão feliz no norte", "a mulher da minha vida era de lá", "lá é que se come bem", blá, blá, blá, tira lá esse fino que ainda morro à sede;
6 - Quer ir à praia? Não desespere que tem três belíssimas opções. Oraportantos se não quiser variar muito ao nível da nebulosidade e da temperatura da água pode ir para as praias da linha de Sintra: não faltam lá nuvens e água que enrijece as carnes que é uma maravilha. Se quiser sentar-se na pontinha da toalha, ter de encolher os presuntos para não pisar o vizinho de baixo e ver com mais pormenor do que o desejava a pilosidade da vizinha do lado, a sua praia de eleição fica na linha de cascais. o mááááximo. Se apesar de tudo preferir uma praia com areal farto, onde pode estender a sua toalhita da moda 3 por 3, água um pouco mais quente onde pode mergulhar sem dar uma traulitada numa rocha ou ouriço, não há que enganar: a sua praia de eleição fica na margem sul do Tejo. Agora é só gramar com 2 horas de pára-arranca, para cada lado, a levar com apitadelas fartas e largar a nota na portagem quedizqueserveparaamanutençaodapontesoquenao;
7 - Se um grupo de amigos o convidar para uns copos no bairro alto não cometa os mesmos 2 erros que eu cometi da primeira vez que lá fui. Primeiro não vá montado no salto agulha (além de me doer o joanete até hoje, ainda estou para perceber como não bati com os costados no chão de tanta entorse no paralelo) e depois não se ponha a beber cerveja à vontadinha que não há onde urinar. Estão a imaginar uma gaja simpática demais, de salto agulha no bairro alto, a bater à porta de gente, que não é sua vizinha, e ainda por cima ter a distinta lata para pedir para urinar na sanita lá de casa?! Acho que ainda hoje tenho o telemóvel sob escuta...